Algumas palavras...sobre lidar com as notícias em tempos de coronavírus
Você já se perguntou qual o impacto as notícias podem ter na nossa saúde? Ou por que algumas pessoas acreditam tão facilmente em uma informação enquanto outras demonstram tanta resistência em acreditar? Uma informação se torna verdadeira quando a maioria das pessoas acredita nela? Como podemos saber se essa informação é verdadeira de fato? Quais os critérios? E algumas dessas coisas mudam na epidemia?
Neste cenário de pandemia e quarentena, o consumo de informações é fundamental como forma de garantir nosso cuidado, mas também pode ser uma fonte de adoecimento. Quando temos acesso a diversas informações que relatam crises e situações de conflito, nosso corpo reconhece a emergência constante de perigo e nos colocamos em situação de alerta, ocasionando sentimentos de angústia, tristeza, desesperança e raiva. Nesse cenário, é comum recorrermos à polarização, em que ou nos abastecemos de forma irrefreada com informações sobre o tema do nosso interesse ou nos abstemos completamente delas, criando a fantasia de normalidade.
Sabendo que uma informação correta pode salvar vidas, não podemos nos abster de notícias, sendo necessário desenvolver estratégias para lidar com as mesmas de forma consciente e saudável.
Nos últimos anos, muito tem se falado sobre a propagação de informações falsas e os impactos disso em diversos contextos. Em época de pandemia, não seria diferente. A crise sanitária internacional ocasionada pelo COVID-19 impactou permanentemente as relações sociais e econômicas em todo o mundo e dentre as situações conflitantes observadas diz respeito ao que a Organização Mundial de Saúde - OMS chamou de epidemia de fake news. A difusão massiva de mentiras e rumores sobre a pandemia compromete o acesso a dados com respaldo técnico especializado das autoridades sanitárias. Essa desinformação desnorteia as pessoas e prejudica a adesão aos cuidados necessários nesse momento de crise.
Agora, como a psicologia pode contribuir nesse cenário?
Primeiramente, precisamos entender que o ato de “acreditar” ou não em uma informação não diz respeito à informação em si — sua estrutura, conteúdo, linguística. Não se trata de algo que possa ser acessado pela cognição ou grau de instrução da pessoa, mas sim pelo sentido subjetivo que a informação desperta. Algo naquela informação confirma uma certeza prévia do sujeito que a lê, confirmando assim uma visão de mundo específica.
Este viés de confirmação é descrito pela psicologia social como uma forte tendência humana de buscar e privilegiar informações que estejam de acordo com suas crenças pré-estabelecidas, pouco importando se tais informações são verdadeiras ou não.
Ao ser confrontado com uma informação que negue alguma crença pré-existente, é comum o sujeito sentir-se desconfortável, angustiado, irritado, pois o seu eu se vê obrigado a se reconfigurar. Veja bem, você já tentou convencer alguém sobre alguma coisa? É difícil não é mesmo? Desfazer crenças causa tanto desconforto, que a ciência psicológica chama essas sensações de dissonância cognitiva. A dissonância cognitiva pode ser entendida como esse mal-estar psicológico que sentimos quando temos valores ou crenças em contradição. Ou seja, quando uma crença pré-existente não pode ser confirmada com uma informação que se demonstra falsa, temos resistência em aceitar a falsidade da informação, pois isso colocaria em cheque nossos valores prévios.
Esse desconforto psicológico é tão significativo que nos valemos de estratégias para minimizá-lo. Uma, bastante comum, é a banalização da contradição em que o sujeito aceita que aquela única informação pode está incorreta, mas o conteúdo dela não. O famoso “isto está fora de contexto”, não foi bem “explicado”. Outra estratégia comum para se reduzir a dor gerada pela dissonância é o raciocínio motivado, onde buscamos invalidar a informação nos envolvemos em um exame crítico de cada detalhe da nova informação. Nos perdemos esmiuçando os contextos, veículos de informação, atores envolvidos, tudo em busca de uma esperança de salvar nossa crença pré-estabelecida.
É partindo dessas contextualizações que precisamos entender que o acesso a informações falsas impacta significativamente no sujeito que as consome, não apenas oportunizando riscos no controle sanitário como aponta a OMS, mas ocasionando sofrimento psíquico aos envolvidos quando são postos de encontro com suas contradições.
Como devemos enfrentar essa situação?
Primeiramente, é fundamental não ofender a inteligência do sujeito, pois isso fechará um canal de comunicação importante nesse momento de crise. Muitas pessoas podem se sentir constrangidas por falar aquilo que verdadeiramente pensam e jamais saberemos se a informação correta foi verdadeiramente assimilada. Precisamos abrir um bom canal de diálogo com o outro e isso parte do reconhecimento da integridade do outro que desejamos dialogar. Como instituição de ensino, podemos contribuir para o processo de educação em saúde e minimizar os maiores rumores envolvendo a crise do coronavírus.
Um exemplo seria apresentar ao sujeito recursos que possam auxiliá-lo nessa busca de conhecimento. Se o sujeito é ativo em seu processo de aprendizagem e desenvolvimento é importante que seja instrumentalizado a utilizar o máximo possível de ferramentas ao seu dispor; agências de verificação de notícias, cartilhas e links de sites oficiais, checagem no Google em diversas meios de informação. Ou seja, formas de verificação das informações. Nesse sentido, não basta enviar as informações de forma generalizada pelos mais diversos canais de comunicação, mas instrumentalizar os sujeitos a consumir essa informação.
A vida em um mundo hipermidiatização é ocasião preciosa para a comunidade escolar desenvolver novos repertórios de comunicação. Rodas de conversa, exibição de documentários, palestras, entre outras atividades, permitem a reflexão sobre a chamada sociedade da informação.
Por fim, pensando no cenário atual, em que uma informação correta pode salvar vidas, é importante que a comunicação oficial possa alcançar as mais diversas pessoas em seus contextos específicos, e a escola pode contribuir nesse processo. Em tempos de crises e emergências, os critérios para saúde mental são alterados, pois é esperado nos três primeiros meses alterações significativas de humor, sono, concentração. Como as informações mudam muito rápido nesses cenários, é recomendado o acesso diário de informações em sites oficiais, como o site do Ministério da saúde, das secretarias de saúde estaduais e até a Organização Mundial de Saúde. O perigo é real e o sujeito precisa se envolver em estratégias concretas para enfrentá-lo. Isso quer dizer que precisamos ver várias informações ao longo do dia? Não! O processo de saúde está no consumo consciente de informações. Escolha um horário, cheque as notícias nos sites oficiais, incorpore as novas informações na sua rotina e pronto.
Nesse sentido, como instituição de ensino, podemos auxiliar os alunos no consumo diário de notícias, de forma saudável e consciente, divulgando as ações da comunidade e interligando as políticas sociais de forma a garantir a intersetorialidade da assistência, o que em última instância é uma ação educativa.
Psicóloga Lorena Costa - Campus Planaltina (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)
Psicóloga Valéria Torres - Campus Recanto das Emas (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)
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